Referências Simpáticas... algumas pitadas de nossas matrizes estético/ emocionais/ criativas/etc...


Live Art. O que é Live Art?

Leitura sugerida por Margie (Margarida Rauen - Curitiba/PR).
Live Art. O que é Live Art? - por Lois Keidan.

Live Art constitui-se essencialmente de obras artísticas temporárias que cobrem diversas áreas e discursos, envolvendo, de alguma maneira, corpo, espaço e tempo. Falar de Live Art é falar de uma pletora de formas de tratar as questões da condição de estar vivo e sua expressão corpórea, algumas das quais ainda nem mesmo existem.
Live Art não deveria ser entendida como a descrição de uma forma de arte, mas sim, como uma estratégia de inclusão de uma diversidade de práticas e artistas que, em outras circunstâncias, se encontrariam “excluídos” de todos os tipos de política e de apoio e de toda espécie de trabalho de curadoria ou de debate crítico.

Usar o termo Live Art não é tentar definir ou estabelecer uma prática, mas, sim, uma estratégia que abre uma nova paisagem, mapeia novas geografias artísticas, imagina novas formas de trabalho e, ao mesmo tempo, cria apropriadas estruturas culturais, críticas e de curadoria em torno desse campo eclético e expansivo de práticas e artistas.

Live Art é, portanto, o termo para um esquema de modelagem, uma forma de abordagem, acomodação e liberdade de uso de novas formas de trabalho, as quais nem sempre se ajustam às estruturas existentes e às configurações e fronteiras rígidas das áreas reconhecidas de expressão artística.

A natureza exploratória da Live Art pode levar à idéia de que se trata de uma área “emergente”, mas isso falseia sua história e sua origem. A Live Art evoluiu a partir das práticas da Arte Performática que radicalizou os espaços de galerias nos últimos anos do século XX, quando, em desafio às políticas sociais e culturais e como rejeição tanto a objetos como a mercados, artistas visuais passaram a apresentar o corpo como seu material e campo de trabalho, e aos conceitos de presença, processo e lugar. Tais transgressões à estética e às convenções das Belas Artes alimentaram e foram, por sua vez, alimentadas por artistas trabalhando nas fronteiras de várias culturas performativas e de performance, bem como pelos praticantes radicais nos domínios da teoria, do comentário e do ativismo cultural.

Desde o final do século XX, uma nova geração de artistas vem desenvolvendo todos os tipos de práticas ao vivo a partir das metodologias explosivas da Arte Performática, mas configuradas pelas realidades do agora.. Trabalhando com meios, contextos e espaços, esses artistas inauguraram, de um jeito impactante, excitante e urgente, novos modelos de criação, novas linguagens para a representação de idéias e identidades, novas formas de mobilizar platéias e novas estratégias de intervenção na esfera do público. Lançaram mão, como diz Adrian Heathfield, da performance como uma força geradora para destruir falsas aparências, romper tradições de representação e trazer novas e diferentes formas de engajamento com o significado.
Ao investigar e testar o permissível e o possível em arte, Live Art gerou aquilo que Joshua Sofaer se referiu como uma explosão da estética convencional e dos conceitos reconhecidos de interdisciplinaridade, hibridez e convergência. Seja desafiando as ortodoxias da prática das Belas Artes, seja explorando os limites da teatralidade, apropriando-se das expressões da cultura de massas, avançando as fronteiras das convenções coreográficas, ocupando a linha de frente do ativismo político ou explorando a performatividade dos espaços virtuais, as práticas da Live Art se apropriam de todos os tipos de meios em um estado volátil. Indo do proibido ao escondido, das demonstrações às apresentações, do doméstico às galerias da Tate Modern, Live Art se envolve ativamente numa pluralidade de contextos culturais e discursos críticos. Live Art é um corpo em expansão de abordagens que oferecem ao público experiências de imersão, envolvendo-o como parceiro cúmplice no fazer e na leitura do significado. Em meio à simultaneidade e interatividade de uma cultura saturada de mídia, Live Art investe em questões do imediato e da realidade, criando espaços para explorar a experimentação das coisas, as ambigüidades do significado e as responsabilidades de cada um como agente. As práticas da Live Art construíram novas estratégias de expressão de identidades, para além das antigas distinções de etnicidade, gênero e sexualidade, nas quais tornam-se visíveis o desprovido e o desincorporado e nas quais contesta-se a política da diferença e a complexidade é confrontada.>
Ao romper as fronteiras e as regras, ao desafiar tradições, ao resistir ao que está definido, ao questionar, mobilizar platéias e expor as lacunas, Live Art apresenta maneiras diferentes de encarar a natureza e a experiência da arte e transforma-se, conseqüentemente, em um das mais potentes e provocativas arenas da cultura contemporânea.

A Live Art consegue mover-se com fluidez entre contextos e estruturas, ocupar todos os tipos de espaços e dirigir-se a qualquer platéia. Pode-se inserir sutilmente em meio ao público como uma intervenção, ocupar um lugar fixo em uma galeria, posicionar-se em uma programação de teatro ou assumir um domínio no ciberespaço.

Assim, enquanto abordagem, a Live Art opera tanto dentro, como na margem, de uma gama de áreas de expressão artística e discursos. Mas dizer que a Live Art situa-se na margem não é sugerir, de modo algum, que seja marginal, mas sim, que testa e percorre limites e fronteiras através e entre áreas disciplinares e concepções.

A Live Art é, hoje em dia, amplamente reconhecida como um dos espaços de criação mais vitais e influentes, com evidente impacto sobre a cultura do “mainstream”. A Live Art é o motor da pesquisa de nossa cultura, criando e ampliando novos espaços para investigações artísticas e forçando-nos a reconsiderar o que é uma platéia e como nos envolvemos com ela.

Promovendo a Live Art
Live Art já é amplamente reconhecida como um campo vibrante e desafiador de prática, tanto em Londres como no resto da Grã-Bretanha. Reflete genuinamente as mudanças que vêm tendo lugar através e entre as artes visuais, performáticas, o teatro, a dança, a nova escrita, a mídia digital e a imagem em movimento e compreende a evolução e a sofisticação das experiências e expectativas de artistas e do público neste tempo de final de um milênio e início de outro.
Durante os anos 90, o impacto dos artistas que trabalhavam na arena da Live Art expandiu-se pelo mundo artístico da capital inglesa e além, dando forma a estruturas críticas, infra-estruturas culturais e à política de produção e consumo de artes. Eles trouxeram ao primeiro plano conceitos de interdisciplinaridade e colaboração, deslocaram os pontos de referência da arte contemporânea e, em sua resposta à hibridez e complexidade das forças em jogo no mundo moderno, contribuíram ativamente para definir de forma mais ampla os debates culturais e sociais.

Live Art provou que, enquanto campo de prática, consegue não apenas desafiar a natureza e a experiência da arte contemporânea, mas também romper com os modos aceitos de leitura do mundo. Mais importante ainda, Live Art levanta questões sobre justamente quem está produzindo arte, para quem e como.

No entanto, sem caminhos definidos ou letreiros para serem seguidos, os processos exploratórios e as amplas bases disciplinares da Live Art sugerem serem necessárias formas alternativas de apoio. Idéias convencionais de treinamento, colocação do produto e marketing não proveêm todas as respostas às indagações quanto ao apoio que os artistas devem receber em seu desenvolvimento artístico e profissional, quando engajados numa área necessariamente diversificada e fragmentada e na qual os conceitos de processo são não apenas críticos, mas inerentes.

Sob pressão para produzir novas obras e simplesmente sobreviver no mercado cultural, a muitos artistas da Live Art têm sido negadas oportunidades de pleno desenvolvimento de suas idéias e práticas ou de auto-determinação de seu papel e representação.As estruturas e estratégias existentes de apoio às artes não dão necessariamente conta das necessidades de desenvolvimento e de status desse setor em contínua evolução. As idéias, processos e práticas exploratórias da Live Art demandam tratamentos alternativos ao que existe em arte, artistas, público e crítica na capital.

Por tal razão é que foi criada a Live Art Development Agency.

Live Culture na Tate Modern

“A Live Culture dá ao público a chance de experimentar novas formas de engajamento artístico e também permite à Tate Modern avaliar o seu papel, não apenas como espaço de preservação e interpretação, mas também como geradora ativa de obras de performance.”
(Sir Nicholas Serota, Diretor da Tate)

Como parte do compromisso da Tate de apoiar as variadas formas de prática artística contemporânea, a Tate Modern colaborou com a Live Art Development Agency no mostra Live Culture, que teve lugar entre 27 e 30 de março de 2003. Esta iniciativa alçou, pela primeira vez, a performance contemporânea à categoria de exibição de coleção da galeria.

A Live Culture forneceu uma oportunidade de envolvimento com a natureza cambiante da prática da Live Art em relação às artes visuais, ao reunir artistas, teóricos e curadores renomados para debater e avaliar a expansão da arte de performance por campos artísticos e sociais mais amplos e seu papel na mudança cultural.

O ressurgimento do interesse em práticas experimentais e performáticas no âmbito das artes visuais e a condição de algo vivo como objeto e valor principal, em meio ao ambiente atulhado de mídia da cultura contemporânea, fizeram da Live Culture uma intervenção oportuna e crítica em relação aos discursos correntes. Live Culture foi uma referência para avaliar mudanças-chaves ocorridas na arte performática nas últimas décadas: seu desdobramento para fora do espaço de galeria, rumo a outros espaços e formas; sua natureza cada vez mais híbrida e o rompimento das fronteiras globais e culturais; seu uso do arriscado e do extremo no confronto da arte e da política do corpo; sua influência no ativismo social e na atuação política; sua interface com o mundo digital e seu papel enquanto espaço para expressões de novas identidades para além das distinções de etnicidade, gênero e sexualidade.

Com Live Culture iluminaram-se os caminhos pelos quais o termo Live Art passou a representar um conjunto de práticas contemporâneas que empregam a performance como sua força geradora para destruir falsas aparências, desfazer tradições de representação e abrir alternativas de engajamento com o significado.

Lois Keidan
Lois Keidan é o co-fundadora e diretora da Live Art Development Agency, a principal organização de desenvolvimento da Live Art no Reino Unido. Criada em 1999, a Live Art Development Agency dá informações práticas e orientação, oferece oportunidades para pesquisa, treinamento, diálogo e debate, trabalha em parceria com os artistas e organizações em iniciativas de curadoria e desenvolve novos meios para tornar a Live Art mais apreciada por parte do público e da crítica.

De 1992 a 1997 ela foi diretora de Live Arts no Institute of Contemporary Arts, em Londres, responsável pela programação anual dedicada ao apoio e à representação de novos artistas, novas concepções e novas práticas, tanto do Reino Unido como de todo o mundo. Antes, ela fora responsável pela política nacional e apoio à arte performática e a práticas interdisciplinares no Conselho de Artes da Inglaterra.

Lois Keidan tem escrito artigos sobre Live Art para uma série de revistas e publicações e realiza palestras e apresentações em festivais, universidades, eventos e conferências, tanto no Reino Unido como internacionalmente.

Para maiores informações sobre a Live Art Development Agency, visite o site www.thisisliveart.co.uk


Informações Adicionais
Artistas
Veja este site para links com artistas individuais: www.thisisliveart.co.uk
Entidadeshttp://www.tate.org.uk/modern/exhibitions/liveculture/
As seguintes entidades são membros fundadores da Live Art UK (www.liveartuk.org):
Arnolfiniwww.arnolfini.org.uk
Artsadmin – Artists’ Advisory Servicewww.artsadmin.co.uk
Bluecoatwww.bluecoatartscentre.com
Chapter Arts Centrewww.chapter.org
Colchester Arts Centrewww.colchesterartscentre.com
Fierce Earthwww.fierce.info
green roomwww.greenroomarts.org
New Moves Internationalwww.newmoves.co.uk
New Work Networkwww.newworknetwork.org.uk
NOW www.beherenow.org.uk
Tramwaywww.tramway.org
Texto disponibilizado pela Live Art Development Agency

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Corpos moldados com "amarras"

Queridas simpáticas. Seguem duas imagens que gosto muito e que muito a ver com o que vcs fizeram ontem... Trabalhos que adoro...

Hans Bellmer
A Boneca, 1938
Die Puppe
Fotografia colorida, 5,3 x 5,4 cm

"Não havia na idéia da boneca, que só vogava nas projeções dos nossos pensamentos, que, apesar do seu aspecto dócil infinito, sabia conduzir-nos as desespero através da sua reserva... o que a imaginação procurava em desejo e intensificação?" H. B.















Hans Bellmer
Unica, 1958
Fotografia em preto e branco 6X6 cm
Coleção Particular

"Guardando no espírito a recordação, que nos fica de uma certa fotografia, um homem tinha , para modificar as formas da sua vítima, atacado cegamente as coxas, os ombros, o peito, as costas e a barriga, com um arame muito esticado, fazendo aparecer rolos de carne , triângulos irregulares e esféricos; tinha traçado rugas compridas e lábios imundos e multiplicado seios munca vistos em locais indizíveis". H. B.

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PARIR E GOZAR

texto encaminhado por Luciana Navarro à Stéphany Mattanó

Numa reportagem sem vergonha, a relação entre maternidade e sexualidade

14.05.2009 | Texto por Fernanda Danelon Fotos Roberta Dabdab Ilustração Milena Galli e Rafaela Ranzani

Prepare-se para quebrar o paradigma de que parir é sofrer. Pela primeira vez numa revista feminina brasileira, a relação entre maternidade e sexualidade – sem tabus

Kalu Brum tem 29 anos e é mãe de Miguel, nascido há dois de forma natural. Ninguém melhor do que ela para descrever o parto: “Lembro da sensação quente, do escorregar daquele pequeno corpo pelas minhas entranhas. Eu estava ali, nua, fêmea, selvagem, desfrutando do prazer mais intenso que já vivi. Um longo orgasmo selou sua passagem para esta vida, quebrando com o paradigma de que nascer é sofrer”.

Gozar no parto, como assim? Qualquer menina com mais de 15 anos sabe a resposta sobre “a pior dor que existe”: “A do parto, claro!”. Mas, para as mulheres que passaram por uma experiência de parto natural, há uma opinião unânime: é possível sentir as contrações com prazer. Isso porque a mulher, assim como cada fêmea do reino animal, possui um sistema reprodutivo perfeitamente organizado para a manutenção da espécie, garantindo que gestar e parir sejam experiências seguras – e até prazerosas. Num parto normal, livre de intervenções médicas, o organismo se encarrega de produzir os próprios analgésicos. Tudo bem, isso você já sabe, já viu no Discovery Home and Health, já leu no blog de uma amiga natureba. Provavelmente, porém, você desconhece mulheres que relatam verdadeiros orgasmos durante o parto. “É lógico que a mulher pode ter uma experiência prazerosa e estimulante ao parir. Nem todo parto resulta num orgasmo, mas se tudo ocorrer de forma equilibrada, e a mulher não fizer uso de analgesia, é perfeitamente possível que ela tenha um momento de grande prazer, principalmente na hora da expulsão do bebê”, afirma Carlos Czeresnia, ginecologista obstetra que acompanha partos há 35 anos e que, entre outras coisas, foi chefe do setor de ginecologia do Pronto Socorro do Hospital das Clínicas/FMUSP e é especialista em reprodução humana. “Os movimentos de distensão e contração do períneo no momento em que o bebê vai sair são muito semelhantes à sensação do orgasmo. E o cérebro interpreta esses estímulos neurais com respostas de prazer. O parto e o orgasmo percorrem o mesmo caminho neurológico”, completa.

Jato de prazer

O assunto, tratado como tabu por muito tempo, tem vindo à tona em conversas de recém-mães. E também por causa de um documentário que rodou os festivais de cinema do mundo, o Orgasmic Birth (veja box). “O parto é um ato fisiológico e não cirúrgico. Durante o trabalho de parto, o principal hormônio produzido, responsável pelas contrações do útero, é a ocitocina, liberada em situações de prazer. Esse hormônio é produzido em jato, por exemplo, durante o orgasmo feminino e também na amamentação”, esclarece. Adaílton Salvatore, ginecologista obstetra, especialista em homeopatia e acupuntura. Com mais de 1.600 partos no currículo – 65% deles normais – e passagens por maternidades na França, na Alemanha e na Inglaterra, o médico explica que, durante o trabalho de parto, muitas glândulas funcionam ao mesmo tempo e são muitos os hormônios atuantes. Entre eles, estão os opioides endógenos, cuja molécula, semelhante à do ópio, provoca um estado de euforia, alegria, leveza. “Nesse contexto, o parto pode ser visto como um rito de passagem.”

Respira e goza

Para sentir prazer no parto, a mulher não pode ter medo. A sensação de perigo alerta o cérebro, que acaba por produzir mais adrenalina – inibidora da ocitocina –, deixando corpo e mente sob estresse. Mas medidas simples podem ser tomadas para que tudo aconteça de forma equilibrada, permitindo que o sistema límbico, parte mais primitiva do cérebro, produza as substâncias necessárias a essa orquestração hormonal. “Um parto próximo do ideal é aquele em que a mulher pode esquecer a razão, se desligar do funcionamento racional do cérebro, representado pelo neocórtex”, explica a psicanalista Vera Iaconelli, do Instituto Sedes Sapientiae. “A mulher tem direito a relaxar, a não ser interrompida, a ficar em contato com o seu corpo. O trabalho de parto implica um funcionamento muito primitivo, que ocorre em situações excepcionais, como durante o sexo”, compara.

Geralmente expostas a ambientes com luz forte, barulhos, gente entrando e saindo, as parturientes não conseguem relaxar: “Não dá para ter prazer no parto com medo, assim como não dá para ter prazer no sexo se estiver amedrontada. Para ter prazer sexual você precisa de intimidade. Só assim é possível desligar o neocórtex. Sob pressão, ninguém tem prazer”, ressalta Ana Cristina Duarte, doula (profissional que garante o bem-estar da mulher durante o parto) e parteira formada no ano passado na primeira turma do curso superior de obstetrícia da USP, reaberto em 2005 após 33 anos de extinção.

Sheila Ribeiro, quando pariu sua segunda filha, estava no lugar mais íntimo do mundo, sua casa. Ela já tinha sentido um orgasmo durante a expulsão da primogênita, Thalita. Mas a dilatação ocorreu de maneira tão rápida e indolor no segundo parto que Naiara nasceu de repente, desassistida por médicos e enfermeiras. “De cócoras, tive o maior orgasmo da minha vida, com aquela sensação que partiu da vagina e percorreu meu corpo inteiro, da ponta do dedão ao último fio de cabelo”, confessa. A advogada, hoje com 49 anos, atribui a “maravilhosa experiência” ao seu estilo de vida saudável, à prática de exercícios, ao tratamento homeopático. Sua teoria encontra respaldo na maneira como pensa – e trata as pacientes – o doutor Adaílton. Para ele, o primitivo está completamente esquecido hoje, afinal, vivemos na era da razão. “Pensamos: ‘Para que caminhar, se posso ficar em casa e produzir algo?’. A atividade física perdeu para a intelectual. Nesse clima competitivo, a mulher vive sob adrenalina, fabricando mais testosterona”, afirma o médico, que argumenta que o sistema imunológico de muitas mulheres está desvitalizado. Atribui isso ao estilo de vida da maioria da população, que come alimentos refinados, pobres em oligoelementos (microminerais fundamentais para a formação de enzimas vitais). “Tudo isso altera nossa fisiologia. O trabalho de parto é uma maratona, o organismo precisa estar bem. Ouça os gritos de uma mulher durante o parto: são guturais. Urros instintivos que emergem da parte mais primitiva de seu cérebro.”

Armadilha
Debra Pascali-Bonaro, doula há 26 anos, mãe de três filhos de parto natural, conhece essa história: “O parto possibilita uma nova perspectiva de si mesma. As mulheres que têm um parto prazeroso sentem-se confiantes, conscientes de seus poderes. Temos que questionar o sistema que medicalizou o parto, pois muitas mulheres perdem a oportunidade, profundamente transformadora, que pode ser dar à luz”, diz a americana, autora do documentário Orgasmic Birth.

Assim como Debra, as 15 mulheres ouvidas para esta reportagem concordam que, muitas vezes, os esquemas dos médicos acabam impedindo que a mulher experimente esse prazer. Ao mesmo tempo, elas constatam que isso também pode virar uma armadilha. Além de “ter que” ser linda, superprofissional, boa mãe, ter parto normal, só faltava a mulher “ter que” sentir prazer ao parir: “A ideia é resgatar a naturalidade do parto e, assim, também a sexualidade inerente a ele. Mas idealizá-lo pode gerar frustração”, destaca Vera, seguida por Ana Cris, a doula: “É perigoso colocar o orgasmo como um objetivo”. Entenda-se: para permitir que o menor diâmetro da cabeça se molde para atravessar a pelve materna, o bebê costuma se virar em algum momento. “Ao passar pelo canal de parto (vagina), ele apoia a parte de trás da cabeça, o cocuruto, bem onde está o clitóris, para fazer um movimento rotativo e poder sair. Esse apoio se dá em uma região repleta de receptores de prazer. Além disso, a cabeça do bebê funciona como um rolo compressor, relaxando e tonificando os músculos da pelve”, explica o doutor Adaílton.

Professora da técnica corporal Alexander, Ana Thomaz, 42 anos, gargalhava durante as contrações: “Eu não acreditava que estava tendo um parto orgásmico! Já tinha ouvido falar nisso, mas não nutri nenhuma expectativa nesse sentido”, conta. Talvez tenha sido justamente essa falta de expectativa que a tenha levado a um parto prazeroso. “A gestante precisa buscar informações além dos consultórios. Muitos médicos desestimulam o desejo de um parto normal, então é melhor encontrar um profissional que abra o maior leque de possibilidades”, aconselha a psicanalista Vera.

Tão imprevisível quanto o prazer ao amamentar, capítulo seguinte ao parto, quando muitas mulheres se assustam ou se envergonham da sensação prazerosa que têm ao dar de mamar. “Por que a natureza colocou receptores de prazer no mamilo? A mama é para o filhote e a mulher deve, sim, sentir prazer. Todos esses hormônios que ela produz, a endorfina, a ocitocina, vão para o leite do bebê”, afirma Ana Cris, antes de concluir: “Mas a amamentação é politicamente correta, cena plácida, que recebe campanhas de incentivo. Mas prazer no parto? Como assim, é louca?”.

SEGREDO BEM GUARDADO

Após trabalhar por mais de duas décadas assistindo partos, a doula e educadora perinatal Debra Pascali-Bonaro percebeu que a mídia norte-americana tratava o nascimento como uma questão de emergência médica. “Por que ninguém falava sobre a natureza sensual do parto, do êxtase que ele pode proporcionar?” Começou, então, a falar do assunto para pequenos grupos de gestantes. Mas não estava satisfeita, queria contar para um grande número de pessoas. E foi dormindo que Debra teve o insight. “Tive um sonho com o filme e, quando acordei, tinha encontrado a fórmula!” Ao registrar o aspecto sexual do nascimento através da história de 11 casais que optaram pelo parto normal, o filme, intitulado Orgasmic Birth, causou comoção no circuito mundial de festivais quando foi lançado, em 2007. Foi exibido, inclusive, durante o Festival do Rio 2008. “Já rodou em 31 países. Não tinha ideia de que este seria um assunto de tanto interesse no mundo todo”, diz Debra. “Acho fundamental que os casais grávidos ouçam histórias de quem teve um parto prazeroso. Ao assistir ao filme, uma nova perspectiva se abre a quem espera uma criança. Brinco que o documentário revela um segredo bem guardado. Afinal, se a mulher não conhece suas opções, então ela não tem nenhuma.” Vai lá: www.orgasmicbirth.com

“SENTIA QUE TINHA VIRADO BICHO”

POR DANIELA BUONO*

“Passei dias trabalhando na edição de um vídeo que quase me enlouqueceu. No dia da entrega, fui ao banheiro e, de repente, chuáááá: ‘Caraca, a bolsa estourou!’. Fiquei aflita e chamei o editor. ‘Fala sério, Dani! Não tenho a menor ideia do que fazer numa hora dessas.’ Nem eu tinha. Fiquei lá mais um pouco, sentada, retomando as lições aprendidas nos últimos meses. Estava com 36 semanas e três dias, o que significava que minha bebê ainda estava prematura. O que seria do meu sonho de ter um parto natural? ‘80% a 90% de chance de ser um parto normal’, disse o médico. ‘Mas precisamos que você entre em TP (trabalho de parto) nas próximas 24horas’, completou. Flávio me pegou e fomos para a maternidade. Tomei um banho e me sentia tão feliz. Parecia que estava me preparando para casar. Tinha certeza de que daria tudo certo!

A doula me aconselhou a relaxar porque a adrenalina podia atrapalhar a ação da ocitocina, o hormônio que eu precisava produzir para começar o TP. As contrações já estavam fortes, mas suportáveis. Senti um imenso prazer por perceber que a hora estava chegando. Sentia dor, mas também prazer e muita emoção. A cada contração, uma força maior me atravessava. E essa força ia, pouco a pouco, me conectando a todas as minhas ancestrais, como se elas estivessem me contando um segredo. Procurava toda hora os olhos do Flávio, como se precisasse passar um pouco daquela energia pra ele.

Aí a dor aumentou muito e eu já não achava posição. Os gemidos aumentaram, eu estava começando a temer aquela dor. Parecia mais forte do que eu. Fui para o chuveiro e algo sobrenatural aconteceu: sentia que tinha virado bicho. Não havia mais razão, eu era puro instinto! Estava concentradíssima em me deixar abrir para o neném passar. Finalmente, dilatação total. Numa determinada contração, senti o tal anel de fogo, a bebê passando pela vagina. Fiz o dobro de força. Dei um grito e senti um enorme alívio: passou cabeça e corpo de uma vez. ‘Nasceu, Dâ! Nasceu a Maria Clara, meu amor!’, disse o Flávio, superemocionado. Na hora em que ela saiu, ele começou a gemer de êxtase.”

* Daniela Buono
, 35 anos, é jornalista, roteirista e diretora de vídeo.
Além de Maria Clara, de 4 anos, é mãe de Bebel, de 1.


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